Eu, que há anos ando por estas
bandas, nunca vi tamanha desconcertância em um assunto tão simples. Veja que
Eustáquio, chefe de gabinete do prefeito, se meteu numa fria por causa do
chefe. Um fiscal do governo chegou uns dias pra trás querendo ver uns documentos
do Sr. prefeito, mas o prefeito não se encontrava, sobrando o enrosco pro
coitado do Eustáquio.
Acontece que os documentos eram
importantes para assegurar a verba pra construção dum estádio de futebol – Construção
que garantiria mais quatro anos de mandato. A primeira coisa que o Eustáquio
pensou foi entrar no gabinete e ligar pro chefe.
-- Bom, seu fiscal, eu vou dá uma
ligadinha pro prefeito e conferir os documentos.
-- Tá certo, senhor. Mas me diga,
onde se encontra o Sr. Prefeito?
-- É... Ele ‘tá numa viagem de
negócios, se me recordo, em São Paulo. Com licença – Continuou entrando no
gabinete. Pegou o telefone e começou – Alô, Vera! Me liga com o quarto do
prefeito, lá em Guarapari.
-- Hotel Boa Vista, Flaviana, Boa
Tarde!
-- Alô, aqui é o Eustáquio
Ferreiredo, do gabinete de São José do Sul, e eu queria falar com o
prefeito no quarto 526!
-- Olha, seu Elázio, ninguém atende
no quarto. Mas o senhor queria o que? Numa tarde ensolarada e quente como essa,
o senhor acha que alguém ficaria no quarto. Ainda mais o coroa do 526, fique
sabendo de... – Sem deixar a moça finalizar, Eustáquio desligou o telefone,
aflito e preocupado em achar os documentos para o fiscal.
Depois de revirar o gabinete, sem
sucesso, o pobre chefe de gabinete volta ao saguão de espera da prefeitura. O
fiscal, antes absorto em conversa com dona Ana Bólita, a secretária, agora se
vira para Eustáquio, já com uma caneta nas mãos.
-- Eu... Meu... Seu fiscal, eu não
pude falar com o senhor prefeito, ele estava numa reunião importante em Belo
Horizonte.
-- Mas ele não estava em São Paulo? –
retrucou rapidamente o fiscal.
-- É, mas... Teve que pegar um vôo
direto a Belo Horizonte, pra tratar de uns assuntos – replicou mais rápido
ainda o chefe de gabinete – Mas, sua assistente pessoal, Glória, me disse que
os documentos estão lá com eles e que o senhor pode passar aqui na quinta da
semana que vem que tudo vai ‘tá certinho pro senhor vistoriar!
-- Pois bem, seu Eustáquio, o prazo
vence hoje, e se os documentos não estão aqui, eu vou ter que cancelar a verba
pro novo estádio de futebol.
-- Não! Não faça isso, seu fiscal. Dá
um jeitinho nesse prazo pra gente! Se não a eleição... Digo... A população vai
ficar sem estádio... – Com este escorregão, Eustáquio ficou mais nervoso e
vermelho do que já estava e soltou uma leve gagueira.
-- Então, o senhor e o seu prefeito
só pensam em faturar a eleição do mês que vem! Meu caro, aqui acaba minha
visita nessa prefeitura! Passe...
-- NÃO! PELO AMOR DE DEUS, SEU MOÇO!
O se-senhor tem que aprova-var a verba, o pre-prefeito vai me ma-matar! Eu...
Eleição... Verba... tic-tic-tic... – E com esse ruído, Eustáquio foi ao chão,
babando e grunhindo feito um louco. O fiscal, com pena do coitado deu mais uma
chance, afinal.
Na quarta-feira, o prefeito entrava
pelo saguão já perguntando sobre Eustáquio. O porquê dele ter ligado pro
prefeito num descanso.
-- Era sobre a verba do estádio! O
fiscal veio aqui na sexta passada – Respondeu a secretária Ana Bólita.
-- Deu tudo certo, né?
-- Mais ou menos, seu prefeito.
-- Mas, e...?
-- O fiscal disse que virá amanhã ver
os papéis com o senhor. E eu já providenciei estes papéis. Mas ele fez isso por
pena do Eustáquio.
-- O que aconteceu com ele, dona Ana?
-- Depois de tanta pressão pra
enrolar o fiscal, o pobrezinho caiu no chão babando. Teve que sair daqui de
ambulância. Pelo que eu sei tá internado no asilo de loucos, mas não melhorou
quase nada desde sexta.
-- Mas, então o estádio foi aprovado!
-- Ahmm... Foi sim.
-- Perfeito, dona Ana, perfeito!
Texto de Bernardo Fontaniello.
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